A justiça algorítmica usa sistemas automatizados baseados em inteligência artificial para apoiar ou tomar decisões no campo jurídico. Esses sistemas analisam grandes volumes de dados, identificam padrões e, a partir disso, oferecem suporte direto a juízes, promotores e advogados em tarefas como triagem de processos, cálculos de penas e até previsões de reincidência criminal.
Em diversos países, o Judiciário já adotou essas ferramentas, que prometem agilidade, objetividade e eficiência. No entanto, apesar dessas promessas, a realidade revela riscos sérios quando faltam regulamentação e transparência.
O risco da falsa neutralidade na Justiça algorítmica
Muitos veem a justiça algorítmica como neutra por se basear em cálculos matemáticos e decisões automatizadas. No entanto, os algoritmos não são imparciais por natureza. Pessoas os desenvolvem e treinam com dados históricos que, frequentemente, carregam preconceitos e desigualdades sociais.
Se os dados refletem um passado injusto, o algoritmo vai reproduzir esse padrão. Por exemplo, nos Estados Unidos, algumas ferramentas automatizadas passaram a recomendar penas mais severas para pessoas negras. Esse tipo de erro transforma a discriminação em rotina, mas com aparência de legitimidade e precisão técnica.
Falta de transparência e acesso
Além do viés, a justiça algorítmica enfrenta outro problema grave: a falta de transparência. Em muitos casos, nem juízes nem advogados conseguem entender como o sistema chegou àquela decisão. Isso acontece porque os algoritmos estão protegidos por segredos comerciais ou operam com lógicas tão complexas que nem seus próprios criadores conseguem explicá-las de forma clara.
Esse cenário prejudica o direito à ampla defesa. Como questionar uma decisão influenciada por um sistema inacessível e obscuro? O cidadão, assim, perde um direito fundamental, e o Estado enfraquece sua missão de oferecer justiça clara, compreensível e confiável.
Controle humano é indispensável
Mesmo com os avanços tecnológicos, o ser humano deve continuar no centro das decisões jurídicas. A justiça algorítmica pode — e deve — funcionar como ferramenta de apoio. No entanto, ela não pode substituir o julgamento humano, que considera contexto, empatia e princípios éticos.
Juízes e demais operadores do Direito precisam se capacitar tecnicamente para entender os limites e os riscos desses sistemas. Sem essa formação, o Judiciário se torna dependente de soluções que não domina, o que enfraquece sua autonomia e compromete a legitimidade das decisões.
O direito à explicação
Toda pessoa tem o direito de saber como uma decisão judicial foi tomada — e isso inclui decisões influenciadas por algoritmos. A justiça algorítmica deve respeitar esse princípio e garantir explicações claras e acessíveis sobre os critérios utilizados pelo sistema.
Sem esse direito, a Justiça se transforma em uma máquina fria e desumanizada, com decisões automáticas e opacas, afastando-se do cidadão e da própria ideia de justiça como diálogo.
Como regular a justiça algorítmica
Para que a justiça algorítmica funcione de forma ética, ela precisa ser regulamentada. É urgente criar leis que exijam transparência, auditabilidade e supervisão contínua dos sistemas. Também é necessário garantir a responsabilidade legal de quem desenvolve, contrata e utiliza essas ferramentas.
Auditorias independentes e acesso público aos critérios usados pelos algoritmos são medidas básicas. Sem isso, o risco é construir um sistema jurídico mais ágil, porém menos justo.
Onde a tecnologia pode ajudar
Apesar dos riscos, a justiça algorítmica pode ser útil em muitas áreas. Ela pode acelerar o andamento de processos, organizar dados, identificar padrões de decisões e até sugerir caminhos processuais. Essas aplicações aumentam a eficiência e ajudam a reduzir a sobrecarga do Judiciário.
O ponto chave é definir bem os limites. Usar tecnologia para apoiar o ser humano, e não para substituí-lo em decisões que exigem sensibilidade, contexto e responsabilidade.
Conclusão: os cuidados essenciais com a justiça algorítmica
A justiça algorítmica é um caminho sem volta. Ela já faz parte do presente e, em breve, estará ainda mais presente nos tribunais. No entanto, adotar essa tecnologia sem questionar seus riscos é perigoso.
É preciso garantir que esses sistemas sejam transparentes, auditáveis e controlados por pessoas. A justiça não pode ser reduzida a códigos e estatísticas. Ela precisa continuar sendo humana, acessível e justa — mesmo na era dos algoritmos.



